sexta-feira, 18 de junho de 2010

A um ausente



“Tenho razão de sentir saudade,tenho razão de te acusar.Houve um pacto implícito que rompeste e sem te despedires foste embora.(...)
Antecipaste a hora.Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas....” (Drummond)


Tristeza por ter perdido alguém cujos livros ora me revoltavam, ora me apaixonavam.
Sim, perdi, não porque o tivesse na convivência pessoal ou em presença (como queiram);
perdi a futura convivência com novas brigas e identificações. Eu ousava falar com ele em cafés, passando por lunática; fechava livros prometendo não mais lê-los. Lia por 3, 4 vezes o mesmo livro.
Saí de uma livraria recentemente brigada com ele (“como você ousa se referir a Eclesiastes desse jeito?”). O livro se chama Caim.

O conto da ilha desconhecida foi uma demostração de afeto e doçura - ele cuja “montagem humana” era ácida.

Iminência da morte foi um tapa na cara. Ensaio sobre a cegueira, outro. O Ano da Morte de Ricardo Reis, deixei pela metade. (uma das maravilhas de ser leitor é a liberdade; outra, a intimidade com os textos - e com um cheiro dos livros que nenhum perfume francês jamais alcançará)

E as citações! Procurei feito doida (como um monte de gente que conheço) o Livro dos Conselhos (“ Se podes olhar, vê; se podes ver, repara”); o Livro das Evidências (“Tu sabes o nome que te deram, mas tu desconheces o nome que tens”) - pra, depois, ler entrevista no jornal: “eu inventei esses livros”.

Ah, ele seduzia... e como!

E o seu maior encanto era o de não se querer encantador.

Um delicioso saber agridoce se ausentou dos meus olhos hoje.
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