quinta-feira, 28 de julho de 2011

CRÔNICAS DE SOLIDÃO XI - Produção na estrada


"Não digas ao teu próximo: Vai, e volta amanhã que te darei, se já o tens contigo.”Provérbios 3 : 27, 28


Cumpria a ela fazer agir:

Vamoslá:procurarcasacomtextura
e
vermaisalgumasopções
deacordocombriefing
Lembrandoquenessanovacasa
temqueterjanela
ahistóriasemantém
ela
senteovento
nãopodeserumacasavelha
Precisamospesquisar
umanovacasa
comumafachadacolorida.
temosquebuscarumjardim/pomar
Quantosvaiprecisardeverba?
ou
acertamosnavolta?

Falava 40, 50 frames por segundo.
Não todos entendiam o veloz dialeto.

II

No definitivo dia,
profusão de mãos braços cabos refletores e gente
e uma Canon captando a realidade tão necessária ao consumo humano.

Set armado, circo armado:
modelo, de aparência inigualável, contrastava com a crueza e o breu locais -
e ELA estava lá, comandando o movimento e os esforços de vários para que a beleza fosse levada a milhares.

câmeração!, disse o diretor,
fazendo cumprir o obrigatório ritual instantâneo de luzes caras bocas cabelos e pernas.

O som alto abafava o futuro trágico da estrada.

Na locação, um tudo-lindo de horrorizar o acontecer iminente:
Crash.
Cachorro no chão,
Dois no chão,
a estrada cheia de faróis - lentes a realçar
os corpos sangrados de betume e dor.
Tudo fora de quadro e cujo destino não era o glamour do vídeo, mas a espera de ambulâncias lentificadas.


III

Então, ela transgrediu.

Em que pesasse ser figura essencial,
escapou do mundo encantado
e mergulhou na áspera realidade.

Neste momento, ela, com os braços,
disse ação.

Foi para o asfalto negro-ríspido
Nada nude...
E parou o caminho público.

Apesar de motoristas reclamantes, não esmoreceu - interditou a falta de auxílio mútuo:
pediu triângulos sinalizadores e atenção para os que apenas queriam atropelar a dor alheia.

Tirou das entranhas a valentia.

Produziu pessoas e atitudes que salvassem vidas
produziu a ambulância
o socorro
ela produziu nas almas sensibilidade para um acontecimento sem grife.

(que belo take!, diria o diretor de cena, caso estivesse ali)

Na estrada escura fez também direção de fotografia.
(Deus estava lá. Ela pediu, Ele veio)
e garantiu a sobrevivência dos desconhecidos
que sequer sabiam
que alguém,

De longe,
fez o melhor trabalho de sua vida.

É.
“O solidário não quer solidão..."


Rosane Gomes
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