terça-feira, 28 de abril de 2015

Partilha





 “Teresa, se algum sujeito (...) te jurar uma paixão do tamanho de um bonde/Não acredite não, Teresa/ é lágrima de cinema/ é tapeação/ Mentira/ Cai fora. (Manuel Bandeira)

“O amor não seja fingido. Odeiem o que é mau e apegai-vos ao que é bom” (Romanos 12:9)


Pelo presente instrumento peculiar de compromisso de divisão deplorável em que somos partes sem lado, fica estabelecido que:

Paredes feridas e imundas pela desigualdade de intenções, comigo.
Vigas (sustentavam suas incríveis cargas - necrosaram) , comigo.
Chão arrancado dos pés, comigo.
Lar em destroços, comigo.
Coração em escombros, comigo.
Entulhos sangrantes em saco rasgado, a COMLURB não quis levar, então, comigo.
Caçamba para levar as tralhas das minhas crentes teimosas vísceras, comigo.
A desalegria e desesperança da minha filha, comigo.
A delicadeza desperdiçada e despedaçada, comigo.
A lucidez, comigo – não sendo o pai, sem direito de visita.
O amor sofreu de hipóxia, não entra na partilha.
A insanidade ruim e traiçoeira, maior de idade, contigo
A compaixão nasceu comigo. Então, comigo. 
O pungente, lancinante, torturante dissabor, comigo.
As ausências, contigo.
Sua perfídia, contigo – não há espaço na lixeira do prédio para abjetos inorgânicos.

Por estarem assim justos mas descontratados, assinam o presente perante as testemunhas (da desorganização de valores morais) abaixo identificadas:

Partes:

1. !!!!! de ???? da Silva Ingênua Confiante Crédula
2. (Aqui assina a Covardia, procurador – o bastante - deste Outorgante)

Testemunhas:

1. ,,,, ... ! ... ... ! da Silva Desde Sempre Desconfiado Filho
2. ??? de !!! da Silva Estupefata Decepcionada Filha
...........................

É. A divisão de bens não foi justa.
Ficou com pouca coisa.
Não houve sentimento puro e bom que lhe pertencesse.
Só lhe restaram a obscura frieza e a inevitável pequenez.
E, sinto muito, irmão, não há quem advogue em seu favor.
Defensoria Pública só atende a quem tem rendimento de afeto acima de
duas (nossa! a p e n a s duas!) corretas atitudes.

Na próxima, relacione-se logo por meio de procuração AD JUDICIA ET EXTRA.
Mais Prático. Mais conveniente.

E então. E pois.

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Mariana




“Fique assim, meu amor, sempre assim/E se lembre de mim pelas coisas que eu dei./E também não se esqueça de mim/Quando você souber, enfim,
De tudo que eu guardei.” (Valsa para uma menininha)
“E quando lavarem a mágoa, E quando lavarem a alma E quando lavarem a água, 
Lavem os olhos por mim... Quando brotarem as flores, Quando crescerem as matas, Quando colherem os frutos, Digam o gosto pra mim...Digam o gosto pra mim...”(Aos Nossos Filhos)
I
O primeiro som não foi choro,
foi melodia.
Obstetra, pasmo,
disse “ bravo!"

Boca de leite de peito,
desejo de dedo na boca,
choro-vontade-de-colo.
Curuminha cresceu.

II

Menina-luz
aluada
lunar
doze aninhos - toma banho de lua com a mãe.

Feliz,
toma sol também.
Soleada, 
segura e acaricia a bem-me-quer.
Aspira sempre mais do contentamento...
Da tristeza,, tira um sabor madurinho-carambola.

III

Noite sem luar chegou.
Outono trouxe o manto escuro,
e entristeceu os olhos de menina.

IV

Curuminha amadurou precoce.
Ainda assim, alimentou de alfazemas
os arredores.

V

Ventos na varanda, 
trouxeram solidões.
Aproximaram perigos.

VI

Curuminha vela a mãe da ventania,
leva brinco-de-pricesa,
lava mágoa,
toma conta.
Zela. Vela.

Sofre com dores evitáveis,
inevitáveis,
impossíveis,
mas levanta.
Levita.

Sacode a amargura,
faxina a dor.

Enfrenta, sem medo,
as consequências de ser
audaz.

E borda com meigas orquídeas -
de um constante amanhecer pacífico -
as paredes pungentes da casa.


VII 

Ventos mornos na janela trouxeram aconchego.
Curuminha com uma corda de violetas, saiu do abismo.
Mexe os cabelos
de ainda-menina
e, sorrindo luminosa,
fragiliza as maldades
sem poréns.

Malagueta e mel.
Bela - e fera.

Minha absoluta - e única - ternura.




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