segunda-feira, 19 de janeiro de 2015
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
Simples
“O Tejo
é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.” (Alberto Caeiro)
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.” (Alberto Caeiro)
Rumo à padaria para o café da manhã.
O calor aqui está de rachar cabeça, embora a minha já tenha
partido há muito.
Mas me sinto tão bem.
Coisa boa ser recebida pelas garçonetes e o cozinheiro a
fazer meu sanduíche
com extremo afeto e abundância –
requintes de chapa fervente e bastante suor.
Passo pelos donos da banca de jornal,
E abraço a irmã proprietária com muito carinho.
Beijo o irmão proprietário, na espera de uma piada sempre surpreendente
É tão bom me sentir domiciliada.
Somente nessas ruas me reconheço.
Aqui não erro caminhos e não sinto mal.
Na academia faço exercícios
de conversas e alegrias – levantar pesos não carece tanto.
Lá o abraço do amigo psiquiatra me espreme e me exprime,
jogando ao chão as minhas dores – melhor linha terapêutica
não há.
Cheguei hoje, depois de chagas de fazer inveja a Cristo.
Agora está tudo certo e bem.
Neste momento nenhuma agressão me atinge porque não há.
Estou resguardada.
Apenas o verão dessas minhas ruas me refresca a alma
e me salva do sofrimento.
De qualquer maneira, se tudo transtornar,
(me) responsabilizo.
terça-feira, 6 de janeiro de 2015
2 de dezembro
“Papa, can you hear me? Papa, can you see me?
Papa, can you find me in the night?
Papa, can you help me not be frightened? Papa, how I love you. Papa, how
I need you. Papa, how I miss you kissing me goodnight…” (do filme Yentl)
I
Com 34 anos corri meus 10 km. Não como de costume.
Por condenação.
15 graus no Leblon, muita chuva e areia avançando a pista.
Urrei meus piores xingamentos - até o limite da minha
garganta -,
contra um homem que roubou a
imagem de angústia mais íntima.
Saiu no jornal minha figura cinzenta e mendicante.
Meu pai tinha acabado de guardar seus anos no bolso.
Demitiu a vida, sem aviso prévio,
porque ela já não mais cumpria seus deveres.
II
Acordei no susto da madrugada
pensando nele.
Hoje faria quantos?
Não sei.
Desde sempre minha mãe escondia idades
Na esperança de nunca envelhecer.
Ele pouco se preocupava com o tempo.
Usava.
Apreciava peixes
terra
plantas
gentes
mar
A agitação das ruas
O futebol de praia
E vários dedos de prosa.
Quantos faria hoje?
A foto o mantém sempre jovem e orgulhoso,
a não ser funcionário de existir.
Era patrão.
III
Vê-lo no exato momento da parca trouxe
uma dor tão funda, tão intensa, tão muda, tão sufocadora,
que eu não sabia onde pôr meus pulmões para descansar.
Quis jorrar, da boca, o sangue histérico para sujar todos
à minha volta.
Quando expirou, jogou duas vezes o ar pra fora.
Exalou perfume de alívio.
Libertei do corpo cansado a alma sedutora
e dei o óbolo ao barqueiro.
O pagamento me custou uma vida em consignação.
IV
A criança sempre em mim olha pra ele
dizendo:
És belo, és belo, és belo até o infinito.
Quantos faria?
Segura o tempo o retrato.
Quero perguntar ao que parou meu relógio:
Então me diz -
Quantas feridas teve?
Quantas curou?
Por que descaminhos?
Por que dor tão escondida?
Por que sempre choro engolido?
Por que sempre culpa enfronhada na pele?
Por que asfalto da pista, quente e assassino, a entrar-me na
alma?
Por que hipocondria
de afeto?
Como a alegria?
Quando a euforia?
Como seduzir a liberdade?
Quem me resgatará deste abismo do passado?
A foto não me basta, porém me vê: sempre de perfil
sorrindo ou zangando das minhas bobagens.
Quantos faria?
Importa?
Volto a correr na praia
e o meu sangue em ondas
deposita na areia minha filha,
evangelho do avô, a espalhar beleza e palavras que nunca
tive
para honrar sua memória,
e para que eu aprenda a me doer sorrindo,
como ele sempre dizia, sem negociações.
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